(still do filme "Dance Party USA)
A história do cinema é determinada por movimentos - sejam eles frutos das iniciativas em comum de cineastas normalmente conterrâneos, ou cunhadas por j0rnalistas e estudiosos. Enquanto muitos acreditam que a globalização enfraquece o potencial revolucionário de técnicas cultivadas em territórios distantes (que, de fato, precisam ser buriladas em segredo por um certo período até atingirem um formato/linguagem mais sólido), outros se utilizam do enorme leque aberto pelos avanços da tecnologia para ampliar seus contatos e discussões. Exemplo são os vários títulos internacionais que adotaram para si as normas do dinamarquês Dogme 95 (mesmo sem conseguirem a notoriedade dos títulos originais).
Abaixo da linha do hype formal das grandes publicações, disseminado pela rede através dos criadores, participantes e espectadores que os apreciam, ferve um novo movimento: sem maiores alardes, mas firme e constante que começa a chamar a atenção da mídia apenas vários títulos realizados depois. Conhecendo-se através dos vários festivais mantidos por todos os EUA, um grupo de jovens realizdores, quando não estão dirigindo seus próprios filmes, colaboram na realização dos filmes dos colegas. Espalhados por vários estados (Nova York, Massachussets, Texas, Califórnia, etc...), unem-se no objetivo único de fazer cinema e fazem-se notar através dos próprios blogs, publicações especializadas e pelos comentários de espectadores, tão facilmente postados e encontrados pela Internet. Cinema independente realizado com pouco orçamento e integridade artística no famoso esquema da brodagem.
Poderíamos considerar Michael Tully o nosso foco central, de onde poderemos espalhar nossa perspectiva. Diretor do elogiado "Cocaine Angel" e mantenedor do ótimo blog "Boredom at its boredest" da IndieWire, Tully tem o privilégio de não apenas conhecer os realizadores como a oportunidade de estar a par das várias produções, chegando a assistí-las de antemão.
A rede se amplia. Ligados pela iniciativa independete e pelo apreço sincero que cada um dos diretores nutre pelas obras dos colegas, além de apoiados por cinemas que se dispõem a exibir essas obras normalmente com distribuição ou limitada ou inexistente. O mais recente título é "Dance Party USA" de Aaron Katz, ex-funcionário do Pioneer Theatre onde o filme está fazendo seu circuito. Nele, dois jovens de uma cidade dos EUA finalmente se conhecem, quebrando a morosidade de seu cotidiano. O ponto de cisão do filme é um elogiado plano-seqüência de 20 minutos em que Gus revela seu passado sombrio.
Joe Swanberg tem chamado a atenção desde seu primeiro filme, o explícito e contundente "Kissing on the mouth", uma reflexão sobre as relações entre os jovens recém-formados e com problemas de perspectivas em suas vidas. Após "Kissing...", Swanberg dirigiu "LOL", elogiado pela IndieWire e Film Threat e, aos 25 anos, já concluiu seu terceiro filme, o aguardado "Hannah takes the stairs", além de comandar uma ousada série de webpisodes, "Young American Bodies". Swanberg já foi comparado a Fassbinder pela sua atividade e franqueza.
"Hannah takes the stairs" tem participação de Andrew Bujalski, que já se tornou figura de culto por aqui após a exibição de "Mutual Appreciation" no Festival do Rio. Talvez o nome de maior destaque entre o bando, Bujalski alinha com "Mutual..." o bem recebido "Funny Ha Ha". Seu trabalho engrossa a mesma linha estética dos primeiros trabalhos de John Cassavetes e Jim Jarmusch. Improvisação, verborragia e uma intrincada rede de relações que corre feito um lençol d'água sob o assoreamento dos diálogos.
Outros títulos aumentam o movimento, os debuts de diretores como os irmãos Duplass (de "The Puffy Chair", sucesso no SXSW de 2005) e "The Guatemalan Handshake" de Todd Rohal. Exibido no Indie 2005, "Four Eyed Monsters" tornou-se o filme mais inovador pelos teclados da IndieWire. O longa de Arin Crumley e Susan Buice, também integrantes do grupo, driblou os obstáculos de distribuição e, assim como fez David Lynch e seu "INLAND EMPIRE", os diretores optaram pela independência também no modo como trariam seu filme ao público.
A maioria dos filmes é realizado em vídeo digital (as exceções são poucas) e a mídia eletrõnica encarrega-se de fazê-los notar (e aguardar) pelo público. Os festivais fornecem a janela e a descoberta - como bem deveria ser. E a independência vai além de sua produção: não há froneira geográfica que impeça um amigo que se voluntaria a participar, não há engravatado que fique no caminho entre o filme e seu público. E, mesmo sem se conhecerem anteriormente, os cineastas se tornaram atraídos pelas mesmas filmografias e estéticas. Ao encontrarem-se, identificam-se. Um movimento que, ao invés de partir de uma pedra fundamental de discussões entre já conhecidos, vai acidentalmente descobrindo e amalgamando as obras que o construirão.
UPDATE: "Four eyed monsters" é um dos indicados ao prêmio de Melhor Primeiro Filme no Independent Spirit Awards (assim como "Man Push Cart").