O que ver no Indie 2007 em São Paulo? (#1)
A proposta principal do INDIE é trazer novos diretores, que estão no seus primeiros filmes, e que produziram de maneira independente. Claro que para quem procura por um filme na programação do "Novos Diretores, Novos Filmes", a dúvida é: o que vou ver, entre filmes e diretores desconhecidos?
Muitos dos filmes que estão na programação foram inscritos e selecionados por nós, outros foram convidados, com base numa pesquisa de curadoria (o Bernardo também participa, e, principalmente, faz a curadoria do Dark Matinée). No fanzine para tentar diminuir a distância entre o público e os filmes, e redimensionar a dúvida do "o que quero ver" ( se você não for daquele tipo que quer "ver tudo") publicamos alguns textos e declarações dos próprios diretores. A idéia é que as declarações deles, mais do que os prêmios e inúmeros festivais que participaram estimulem a escolha. Então, vou publicando aqui, um pouco sobre alguns filmes da programação.
A NOVA GERAÇÃO POR ELA MESMA
Novos diretores revelam em pequenos testemunhos, entrevistas, detalhes de produção, o que queriam para os seus filmes, seus planos, o desejo de filmar.
O LADRÃO DE MEMÓRIAS
O filme do diretor americano Gil Kofman traz a história de Lukas, um não-judeu que de forma obsessiva resolve assumir a dor de ser um judeu vítima do Holocausto. Kofman relata abaixo como teve a idéia para o filme e o que pretendia ao contar esta história.
O pai, a avó e o tio da minha esposa foram sobreviventes do Holocausto e viveram vidas plenas mesmo ainda ligados às sombras do passado. Podia-se ver a imagem da dor em todos os seus gestos; seus sorrisos, acenos com a cabeça, a maneira com que bebiam o café.
Após tal dor e sofrimento, havia pouco que podiam fazer para se livrar desse fardo. Ignorados pela sociedade e pela civilização em geral, eles ainda conseguiram se casar, criar filhos e continuar a fazer o que pareciam fazer melhor, ‘sobreviver’. Porém quando eventos catastróficos como a Bósnia, Ruanda e Darfur aconteciam, eles ficavam tremendamente desanimados pela repetida falta de interesse do mundo em agir, e você podia ver claramente o doloroso passado ressurgindo no seu presente.
Sempre tive respeito e reverência por estes membros da família. Parte de mim sabia que jamais entenderia esta dor. Por outro lado, uma outra parte de mim sempre teve curiosidade, até mesmo fascínio, pela natureza do seu sofrimento. Como é possível existir depois de tal dor?
O Ladrão de Memórias é meu esforço em fazer uma conexão qualquer com estes sobreviventes. Não necessariamente contar a sua história (temos os arquivos para isso), mas ver como seus relatos poderiam se integrar às nossas vidas atuais e de que forma suas histórias desesperançosas poderiam continuar a ressoar. Eu também queria levar ao extremo o exame da natureza da empatia, bem como investigar o que aconteceria caso se quisesse realmente entender e se identificar com o sofrimento do outro. (Gil Kofman)
Horários que LADRÃO DE MEMÓRIAS será exibido no CINESESC
BLED NUMBER ONE
O diretor Rabah Ameur-Zaïmeche faz em “Bled Number One” uma continuação do seu primeiro filme “Wesh Wesh”. Se no primeiro Kamel, interpretado pelo próprio diretor, estava na França, este marca sua volta à Argélia. Três perguntas para Ameur-Zaïmeche:
O que significa o título Bled Number One ?
É uma tirada contra nossos vizinhos marroquinos e tunisianos. As pessoas do norte da África gostam de fazer piadas umas sobre as outras. Como o filme traz a diáspora argelina, tive que voltar à vila (bled) onde tudo começou, a primeira “bled”. Poderíamos ter dado o nome Bled 0, mas para isso seria necessário que os argelinos fossem menos sensíveis! Se tivéssemos dado esse nome, eles não nos teriam deixado filmar no seu país.
Por que você resolveu também atuar no filme ?
Atuo porque ganho uma sensação de ser tomado pelas coisas, de precisar incorporá-las fisicamente. Além disso, ser ator e diretor pode ser uma experiência de libertação. Quando se passa de um para o outro, significa que você está menos preocupado com as restrições de cada tarefa; isso traz um senso de perspetiva e te permite levar as coisas adiante. Da mesma forma que Kamel, que força seu caminho através das fronteiras.
Você acha que sua nacionalidade francesa de origem argelina te faz ver o mundo de forma
diferente ?
Sim. Tudo parece maior. Felizmente a humanidade não deriva de uma cultura única. Estar dividido entre duas culturas te torna mais consciente do fato de que tudo está mudando. Isso é o que ocorre com os jovens de origem norte-africana que moram nas cidades do interior francês. Estão longe dos seus países de origem e da sua cultura, portanto precisam inventar uma nova forma de se expressar. Não aprendi a fazer filmes numa escola de cinema ou trabalhando como estagiário; aprendi fazendo, de forma bastante empírica. É algo que flui de você e descubro o resultado na sala de edição. Quero fazer os filmes que trago dentro de mim desde a infância.
Leia crítica de BLED NUMBER ONE, publicada pelo Cahiers Du Cinéma em post anterior no blogIndie, clicando aqui.
Horários que BLED NUMBER ONE será exibido no CINESESC
Francesca Azzi