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Matar a mãe ou ser morto por ela?

Logo na entrada da exposição "Primeira Pessoa" (São Paulo, Itáu Cultural) nos deparamos com as 2500 fotografias que Emil Forman fez, e outras colecionou, organizou, decifrou, sobre sua mãe. Diante daquele gigantesco álbum de retratos exposto na parede numa ordem repetidamente obsessiva, diante daquele mulher, mãe do artista vista e revista em todas as idades e em todas as situações de sua família e de sua vida, fiquei pálida.

Todo o tempo do meu olhar, eu pensava como Forman suportou este exercício de organizar sua obsessão. Como suportou ver e rever e recuperar a imagem dela, aquela que foi o seu primeiro olhar especular no mundo (como dizia Lacan), o primeiro olhar onde me vejo como um outro? Onde Forman realmente colocou sua especularização? Seu reflexo nos olhos da sua mãe, a nós (in) visíveis, no entanto, estaria lá, arrancado com suas lentes fotográficas e quando não suas, as do pai, do avó, quiçá.

Por instantes pensei: será que ela nunca se recusou a se deixar fotografar? Qual tipo de exibição se dispunha? A de mulher do Sr. Forman, a de mãe dedicada e junto aos filhos sempre tão cheia de compostura, a de filha sempre elegante, a de mulher incrivelmente moderna e rica que esquia, cavalga, viaja, num "mise en scène" da felicidade, do sorriso bem comportado, do cabelo bem penteado pelo artifício social? Mas de um item não listado mas reconhecido ao longe... o de uma certa fantasia exibicionista, "aquilo que sou, aos olhos de quem vê".

Emil Forman levanta muitas suspeitas ao revelar ( literalmente assim) o seu amor. E levando a fundo a sua obsessão ( imagino que não deva ter sentado no divã jamais, caso contrário não teríamos talvez a coisa toda em si) constrói uma obra quase "pornográfica", numa hiper-exposição de sua intimidade, enquanto filho que projeta a necessidade do jogo de ceder/não ceder a loucura.

Fiquei sabendo mais sobre ele. Emil Forman nasceu no Rio de Janeiro, em 6 de janeiro de 1954 e faleceu na Pensilvânia, Estados Unidos, em 1° de outubro de 1983. Suicidou-se. "Autor de obra singular dentro da produção brasileira na década de 1970, foi um crítico mordaz, às vezes cruel e iconoclasta do gênero humano, de sua própria classe social e da hipocrisia das instituições, mantendo, entretanto, uma certa delicadeza pelo desamparo do homem frente a todas as suas contradições."

A exposição "Primeira Pessoa" tem obras impactantes e uma montagem muito sofisticada, vale a pena uma visita.
(Francesca Azzi)
  INDIE    domingo, novembro 19, 2006
 
 
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