blogINDIE 2006
Verdade Monumental


Festival de documentários É Tudo Verdade traz ao Brasil os dois últimos filmes de Wang Bing


Se a colossal seleção de 137 documentários e a entrada gratuita já não fossem o bastante para fazer do É Tudo Verdade - um dos festivais cinematográficos mais sólidos e importantes do calendário cultural brasileiro - um evento imperdível, a presença nobre de dois monumentos cinematográficos do documentarista chinês Wang Bing fazem-no absolutamente obrigatório.


Os recentes conflitos entre tibetanos e chineses só fazem das sessões dos filmes de Wang Bing ainda mais oportunas: são revelações melancólicas de bastidores, todas as imagens e histórias que o governo local insiste em tentar sufocar, relembrando o peso da cortina apesar de todo o deslumbre e avanço econômico. Mais do que suas visões políticas, o próprio sentido de visão: a estética do documentarista, que opta por tecer hipnotizantes e melancólicos films-fleuves em vídeo digital, um estilo de linguagem que podemos ver sendo recuperadas mundo afora (Pedro Costa, por exemplo, com quem Bing também compartilha temáticas), repleto de planos estáticos, insistentes, a capturar a beleza do mofo das paredes, que nos conta sua história.


O inédito "Fengming: A Chinese Memoir" foi considerado um dos melhores filmes de 2007 por algumas das publicações mais consideradas no meio cinematográfico. Um documentário intimista no qual a jornalista e professora He Fengming reconta sua participação na revolução, um pesadelo no qual fora vítima de injustiça, capturada por ser a esposa de um crítico da burocracia nacional. Seu depoimento acompanha, durante suas três horas de duração, os anos de Mao do início ao fim e reconta em detalhes alarmantes as torturas sofridas nos campos de trabalhos forçados. Não posso dizer mais, ao que também estou no aguardo para assisti-lo.


Mas o que promete mesmo é a exibição das nove horas de "A L'Ouest des Rails" (Tie Xi Qu). Divididos em três volumes: "Rust" - partes 1 e 2 -, "Remnants" e "Rails"), o documentário vencedor do DocLisboa e do Festival de Marselha (entre outros) é um trabalho épico de bravura incomparável no cinema atual (que se opõe em escala e abordagem a "Fengming"). Sem equipe, Wang Bing explora o microcosmos do complexo industrial do distrito de Tie Xi apenas com uma câmera na mão (ouvimos, por exemplo, o ranger da alça da câmera ou de algum toque acidental no equipamento, o que causa uma sensação de imediatismo, aconchego), sem invenções, intervenções ou provocações.Estas indústrias de cobre, cabos e chumbo do nordeste chinês sofreram um crescimento devido ao suporte econômico da União Soviética na época da Guerra Fria; com a abertura do país para o capitalismo, estas indústrias passam a ser gradualmente desativadas a partir de 1999. Wang Bing registra o interior deste organismo decadente: os operários e a rotina das fábricas, que poderão ser soterrados juntos com este corpo gigantesco em avançado estado de decomposição.


Assusta e impressiona a imensidão dos galpões, verdadeiras cidades, povoadas por tipos humildes, camponeses, que utilizam a câmera quando sentem que precisam desabafar sobre tudo aquilo que ocorrera enquanto eles estavam ignorando-a: um documentário observacional e reflexivo que ignora a sequer existência de distinções entre tais abordagens. Revelações paralelas abundam: enquanto Wang Bing se aventura pelos corredores decadentes e mal iluminados da área de funcionários com o máximo de liberdade (exploração pela imagem), os próprios operários se encarregam de, através de suas histórias pessoais, ampliar ainda mais as dimensões dessas indústrias (exploração pelo som; visualização). Alguns podem acusar o despojamento técnico de Bing como não cinematográfico, mas a determinação rígida que transforma o filme numa imersão completa é uma das experiências mais defintivamente cinematográficas a se conseguir de uma exibição.


Mas o É Tudo Verdade também se solidariza com aqueles que queiram documentários que melhor se encaixem na moldura temporal do homem contemporâneo e não possuem sais minerais para encarar Wang Bing: "No End In Sight", documentário que cronografa a lastimável comédia de erros da ocupação americana no Iraque, será exibido; "Stranded", a versão documentário do famigerado "Os Sobreviventes dos Andes" (mais chutado do que pombo atropelado pela crítica em suas eternas reprises na TV Corcovado) que paga uma passagem para os ex-jogadores chilenos de rúgbi recriarem alguns dos eventos no próprio local da tragédia, assim testando os limites do bom gosto; "Operação Cineasta", no qual um jovem estudante de Bagdá, após aparecer na MTV falando sobre seu sonho de se tornar cineasta, é contratado para trabalhar no filme "Uma Vida Iluminada" de Liev Schreiber, mas, ao contrário das expectativas, ele age de forma completamente indiferente à oportunidade, o que nos leva a refletir sobre a política americana de esmolas sociopolíticas; "Joy Division", do documentarista/clipeiro Grant Gee, promete todas as histórias negligenciadas pelo longa "Control", a partir de relatos dos próprios integrantes da banda (Ian Curtis participa via brincadeira do copo). Homenagens a cineastas abundam: temos "Conversas com Billy Wilder" (um depoimento cedido ao amigo alemão Volker Schlondorff) e "A Voz de Bergman", no qual o falecido mestre sueco nos ilumina sobre, entre outras coisas, seus filmes favoritos.


Temos ainda um curiosíssimo "Relato de Memória (13 Lembranças do documentário 'Descrição de um Combate' de Chris Marker)", cuja premissa soa muito como um "Retourne à Normandie" em cima de 'Description d'un Combat'; e o aclamado "Follow the Yellow River" (Up The Yangtze), para aqueles completistas que precisam estender ainda mais seu panorama da China contemporânea. Tempo certamente será uma questão, mas após descobrir Wang Bing, tenho certeza que o que não faltará é motivação.


SERVIÇO:


O Festival É TUDO VERDADE acontece em:

São Paulo: 26/03 a 06/04

Rio de Janeiro: 27/03 a 06/04

Bauru: 10/04 a 13/04

Brasília: 14/04 a 20/04

Recife: 17/04 a 20/04

Caxias (RS): 24/04 a 27/04


Sessões:

ALÉM DOS TRILHOS (A L'Ouest des Rails, 2003)

de Wang Bing

(Parte 1: Ferrugem 1; Parte 2: Ferrugem 2; Parte 3: Vestígios; Parte 4: Trilhos)

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (SÃO PAULO - SP) - 27/03 - 13H00 (PARTE 1) / 15H00 (PARTE 2) / 17H00 (PARTE 3)

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (SÃO PAULO - SP) - 28/03 - 13H00 (PARTE 4)

CINE GLÓRIA (RIO DE JANEIRO - RJ) - 05/04 - 18H00 (PARTE 1) / 20H00 (PARTE 2)

CINE GLÓRIA (RIO DE JANEIRO - RJ) - 06/04 - 16H00 (PARTE 3) / 20H00 (PARTE 4)


FENGMING - MEMÓRIAS DE UMA CHINESA (He Fengming, 2007)

de Wang Bing

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (RIO DE JANEIRO - RJ) - 01/04 - 12H30

CINESESC (SÃO PAULO - SP) - 04/04 - 15H00


SEM FIM À VISTA (No end In Sight, 2006/7)

de Charles Ferguson

UNIBANCO ARTEPLEX (RIO DE JANEIRO - RJ) - 28/03 - 14H00

CINESESC (SÃO PAULO - SP) - 03/04 - 23H00

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (BRASÍLIA - DF) - 16/04 - 20H00

FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO (RECIFE - PE) - 19/04 - 19H00


OPERAÇÃO CINEASTA (Operation Filmmaker, 2007)

de Nina Davenport

CINESESC (SÃO PAULO - SP) - 28/03 - 17H00

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (RIO DE JANEIRO - RJ) - 02/04 - 20H30


SUBINDO O RIO AMARELO (Up the Yangtze, 2007)

de Yung Chang

CINESESC (SÃO PAULO - SP) - 27/03 - 17H00

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (RIO DE JANEIRO - RJ) - 02/04 - 14H30


STRANDED (2007)

de Gonzalo Arijon

CINESESC (SÃO PAULO - SP) - 27/03 - 21H00

UNIBANCO ARTEPLEX (RIO DE JANEIRO - RJ) - 30/03 - 16H00


JOY DIVISION (2006)

de Grant Gee

UNIBANCO ARTEPLEX (RIO DE JANEIRO - RJ) - 28/03 - 22H30

CINESESC (SÃO PAULO - SP) - 04/04 - 23H00


CONVERSAS COM BILLY WILDER (Billy Wilder Speaks, 2006)

de Volker Schlöndorff

CINESESC (SÃO PAULO - SP) - 28/03 - 13H00

UNIBANCO ARTEPLEX (RIO DE JANEIRO - RJ) - 29/03 - 16H00

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (RIO DE JANEIRO - RJ) - 03/04 - 12H30


GERAÇÃO 68 (Genérations 68)

de Simon Brook

CINESESC (SÃO PAULO - SP) - 27/03 - 23H00

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (SÃO PAULO - SP) - 30/03 - 15H00 (Sessão seguida de debate "1968 - 40 anos")

CINESESC (SÃO PAULO - SP) - 03/04 - 10H30 (sessão reservada para estudantes)

UNIBANCO ARTEPLEX (RIO DE JANEIRO - RJ) - 03/04 - 22H30

AUDITÓRIO CPFL PAULISTA (BAURU - SP) - 13/04 - 16H00

UCS CINEMA - CIDADE UNIVERSITÁRIA (CAXIAS - RS) - 27/04 - 20H00

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (BRASÍLIA - DF) - 16/04 - 18H00

FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO (RECIFE - PE) - 19/04 - 17H00


A VOZ DE BERGMAN (Bergmans Röst, 1997)

de Gunnar Bergdahl

CINESESC (SÃO PAULO - SP) - 27/03 - 13H00

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (RIO DE JANEIRO - RJ) - 02/04 - 12H00


DESCRIÇÃO DE UMA MEMÓRIA (Ts'as Revi'i La'matbe'a, 2006)

de Dan Geva

CINESESC (SÃO PAULO - SP) - 01/04 - 17H00

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (RIO DE JANEIRO - RJ) - 04/04 - 20H30

AUDITÓRIO CPFL PAULISTA (BAURU - SP) - 13/04 - 18H00

UCS CINEMA - CIDADE UNIVERSITÁRIA (CAXIAS - RS) - 26/04 - 16H00

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL (BRASÍLIA - DF) - 15/04 - 18H00

FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO (RECIFE - PE) - 18/04 - 17H00
  Bernardo Krivochein    quarta-feira, março 26, 2008    1 comentários
 
 
Interpol no Rio de Janeiro: A Banda Que Era Capaz


Você já conhece esta história: um grupo consegue improvavelmente chegar à uma locação inóspita para se apresentar, mas um acidente interrompe seus esforços antes de cruzarem a linha de chegada. Porém, seu dramático esforço para superar os obstáculos acaba por conquistar o coração do público local. Esta é a sinopse de "Jamaica Abaixo de Zero". Foi também a sinopse do show do Interpol, na Fundição Progresso (RJ).

Sem querer ser provocativo, mas as músicas do Interpol eram para mim como alguns funks cariocas, músicas da Ivete Sangalo ou uns desses dance-farofas de rádio: você não gosta delas particularmente, mas sua presença se faz tão maciça ao seu redor que acaba-se absoverdo-as por osmose - quando menos se espera, lá está você assobiando o refrão de "Love Generation" inconscientemente. Principalmente no caso do Interpol - presença hors-concours em qualquer festa de rock alternativo (esse termo ainda se usa?), mas banda com a qual me encontro ligeiramente fora de sincronia emocional. Estes sucessos de pista dos nova-iorquinos caracterizam-se por um rebuscamento lírico (um tantinho pretensioso, convenhamos) à beira da verborragia, por um cinismo desolado(praticamente toda a letra de "Evil", discutivelmente o grande hit), e ainda alguma punição e determinismo ("Slow Hands" e "The Heimlich Maneuver"). Não que eu seja afortunado ou alienado ao ponto de não reconhecer tais sentimentos - evocados com maestria pelas letras de Paul Banks, é verdade - mas simplemente não me identifico mais com eles. Então, quando enfrentei a tempestade à caminho da Fundição Progresso, estava fazendo como qualquer playboy à caminho de uma micareta ou de uma festa hypada de minimal electro: eu estava indo apenas pelo evento.

Na noite de quinta-feira acabou o suspense de um céu nublado que já vinha ameaçando castigar o Rio há duas semanas. Não menospreze a chuva que caiu, a própria fúria divina em forma de sublimação meteorológica; uma daquelas intempéries que já fizeram a má fama do sistema de escoamento da cidade (março de 1986). Existe um episódio de "Os Simpsons", no qual o Spinal Tap se apresenta em Springfield: como a cidade não tem uma arena apropriada para shows, a banda de Christopher Guest e cia. é obrigada a apresentar-se no palco improvisado: nada menos que o rinque de patinação local, descongelado apenas no dia anterior e repleto de perigosas poças d'água. As goteiras onipresentes da Fundiçao Progresso fizeram do show do Interpol um misto de apreensão e vergonha: apreensão, pois as goteiras se distribuíam não apenas sobre o público como também no palco, a alguns centímetros do vocalista (e o perigo eminente acabou se concretizando, como descreverei a seguir); vergonha porque alimenta ainda mais o imaginário gringo do Rio de Janeiro como uma versão "parque temático" de Cuba: um abandono rústico cool, perigoso, mambembe (uma impressão que é verdadeira e falsa ao mesmo tempo). Poderíamos até dizer que, para um público que se apresentava em massa para cantar em uníssono letras melancólicas e festejar a própria miséria, tal tempestade era uma dádiva, mas a lama nos Vans brancos provavelmente indicariam o contrário.

Deu o que tinha que dar: praticamente em cima da mesa de som, abre-se uma verdadeira cachoeira. Uma queda d'água de chuva imunda, acumulada por horas, a cair ininterruptamente sobre computadores e público por vários minutos. No final de um dos números, o feed das guitarras é interrompido e força a banda a se retirar do palco. O público em torno da mesa de som foi surpreendido pela estranha visão de todos os monitores e luzes apagados. E, de repente, não havia mais luz no palco. Os técnicos sobem com lanternas em punho, tentando resolver o problema. Mas o problema deixara de ser fio solto: alguém teria que ir no vizinho para ver se tinha algum fusível para emprestar.

Passa a existir uma silenciosa camaradagem entre os mais opostos dos indivíduos quando estes se percebem juntos na mesma merda. Falta de som não é um motivo pequeno para se cancelar um show por completo; já vimos shows sendo interrompidos por problemas bem menores. Quando o público, mesmo com chuva e falta de energia elétrica (além de "Bento Carneiro", o morcego-mascote da Fundição Progresso que ofereceu seus maravilhosos vôos rasantes sobre o público durante o intervalo), não arredou o pé apenas para descobrir que, ao contrário do que se espera de muitos gringos, o Interpol havia esperado nos bastidores para continuar, assim como eles, o show, que estava meia-bomba até então, explodiu nos números finais com um misto de gratidão, surpresa e identificação entre artista e público. Solidificou-se um compromisso: eles queriam definitivamente tocar, nós queríamos definitivamente vê-los, e nos respondemos simultaneamente. As falhas - controláveis ou incontroláveis - como no cinema acabam aproximando público e artista no aconchego da casualidade, revelando a idéia e a vontade que normalmente ficam escondidas em valores de embalagens. Contos de bastidores revelam que a banda achou os shows de SP e BH "great", mas o do RJ foi "fucking awesome".

O show do Interpol na Fundição Progresso merecia um DVD. Não porque fora perfeito; afinal, estes shows para DVDs tem seus números gravados diversas vezes para atingir uma perfeição artificial (o que deseduca a maioria do público a exigir desses eventos essa precisão sintética, cinematográfica, impossível). Merecia um DVD porque foi uma experiência dramática e que rendeu uma série de emoções espontâneas dos artistas e dos espectadores. Foi um show para entrar na memória porque improvavelmente aconteceu até o fim (com direito a bis duplo) e contra todos os obstáculos provou o seu valor. Nem os banhos de querosene que o público foi obrigado a tomar em casa para se limpar da enchente imunda que os aguardava na saída conseguiu apagar o gosto bom que o show acabou deixando.

E sim, passei a gostar mais do Interpol após a apresentação. Até comprei uma camiseta no final, ainda que apenas para me relembrar da confortável sensação de estar seco de novo.

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  Bernardo Krivochein    segunda-feira, março 24, 2008    2 comentários
 
 


Le Cube, em Paris, receberá mostra de videoarte brasileira: Brazil Knows What Videoart is.


Em evento único, no dia 27 de março próximo, o Le Cube, centro cultural de criação numérica, totalmente dedicado aos meios de produção estética digital (saiba mais sobre o Le Cube) receberá uma mostra de videoarte brasileira contemporânea intitulada "Brazil Knows What Videoart is". O convite para mostrar trabalhos brasileiros partiu da diretora de programação do Le Cube, Carine Le Malet, que me chamou para esta curadoria.

A idéia do "Brazil Knows What Videoart is" foi apresentada com a seguinte reflexão:

"O momento é oportuno, instável. Mais de 30 anos se passaram desde a primeira experiência estética com o vídeo no Brasil (Ana Lívia Cordeiro, M3X3 -1973 e Letícia Parente, Marca Registrada -1974). Muita coisa aconteceu, dezenas de artistas se especializaram, e não só incorporaram o vídeo à sua arte, como o tornaram fundamento de seus experimentos de linguagem. A videoarte deixou registros fundamentais na história das artes brasileiras. Nos anos 80 e 90, o vídeo chegou ao seu ápice de um excesso de expressividade. Hoje estamos vivendo o momento da página branca. A transitoriedade deste momento se deve em parte ao desgaste do uso excessivo da linguagem, ao próprio meio instável e incorporável, ao acesso tecnológico disseminado, a convergência de mídias. A resposta é incerta, mas os artistas estão em outra. A linguagem não é mais o centro da questão. Procura-se uma paisagem, uma verdade, um cotidiano, enfim um retorno à subjetividade. Intenciona-se ser mínimo, às vezes ingênuo, às vezes, informal e errático. Não interessa tanto mais o meio, a mídia, e suas supostas verdades. Acaba-se uma era, morre a intenção de que a linguagem seja o centro de uma experiência estética. A página está virada. Vejamos."

Interessava mostrar a abordagem (das idéias, das imagens) desta nova geração. Serão exibidos dois trabalhos do artista Carlosmagno Rodrigues ( Sebastião, O Homem que Bebia Querosene & Diante do Abismo de Seus Olhos). Carlosmagno, que talvez seja o mais experiente da seleção, possui um trabalho contundente e denso que sempre perpassa pelos conteúdos pós-existencialistas, pós-comunistas e anti-capitalistas que lançam perguntas sobre a vida/morte, e principalmente sobre a inadequação do homem moderno visto metaforicamente numa imagem de menino ( o maravilhoso Bruno, filho de Magno) que fala frases filosóficas, adultas demais para todos nós, mas que projeta uma mistura de remorso, recalque, daquilo que a vida, o tempo todo nos nega. A narratividade de Carlosmagno está em seu estilo recorrente, imagens icônicas velhas e gastas, transportadas para um mundo um tanto misterioso, inóspito visualmente mas vibrante no qual frases emblemáticas são repetidas e contempladas como fruto de uma cultura contemporânea da imagem, já nostálgica e, portanto, sem esperança.

Na mostra estão ainda quatro trabalhos de Roberto Bellini,( I Give Up/Landscape Theory/Opaco/Através do Vidro) um dos artistas que transita da animação às "narrativas de observação". Estas narrativas (comum em vários trabalhos da seleção como "Buraco" e "Enquadrado" de Leandro Lima & Gisela Motta e em "Spree" de Marcellvs l.) tratam de uma "ordem do olhar" que paira sobre seu plácido objeto, à espreita do acaso e do pequeno fato. Ao contrário da linguagem vibrante da vídeoarte dos anos 80/90 retorna-se a essência daquilo que é uma imagem verdadeira, limpa e sem maquiagens da edição.

Mas não é uma imagem por si só, há ainda uma montagem/edição bem cuidada que privilegia o ponto inicial desta imagem, mas que requer um exercício para a observação ( as sombras de "Opaco", os lugares incomuns/comuns de "Buraco" etc). "Spree" de Marcellvs, por exemplo, nada mais é do que a observação de duas fachadas semelhantes e desemelhantes, que tem um movimento quase imperceptível.

Ainda na mostra, a jovem Alice Miceli com seu projeto "Dízima Periódica" e "Jerks Off" que joga com a redundância/repetição do último instante de minuto - para quem sabe descobrir novos recursos conceituais. E a última performance da espanhola radicada no Brasil, Sara Ramo, "Amor Fatti". Nela, Sara está de branco e dança com um companheiro, um boneco de papelão.

"i321" é o trabalho radicalmente gráfico da dupla paulista Ricardo Carioba & Fábio Torres que constrói uma relação nada casual entre imagens geométricas e sons originais, eles formam o grupo UDDQEM e MÜVI.

Fechando a idéia da mostra dois trabalhos de videodança ( uma espécie de subgênero dentro da videoarte que ainda requer atenção graças a evidência das artes do corpo) produzidos em grupo:"FF" de Karenina de Los Santos, Letícia Nabuco, Marcello Stroppa e Tatiana Gentile e "Sensações Contrárias" dos baianos Amadeu Alban, Jorge Alencar, Matheus Rocha.

A mostra BRAZIL KNOWS WHAT VIDEOART IS pretende fazer apenas um pequeno recorte da criação atual do vídeo por aqui.
  Francesca Azzi    terça-feira, março 18, 2008    3 comentários
 
 
A Voz

Para aqueles que se aventurarão assistindo "O Orfanato" este fim de semana apenas no intuito de testemunhar a presença nobre de Edgar Vivar - o Sr. Barriga de "Chaves" - uma boa notícia: ele está na melhor parte do filme. A má notícia é que ele está quase irreconhecível, parecendo muito mais o comparsa de Borat do que o afável agiota do seriado mexicano. Mas é ele lá, na telona, num pequeno bom papel (ele aparece, faz alguma coisa e some minutos depois, junto com Geraldine Chaplin). Isso já vale a sessão - ainda que possamos argumentar que seja uma das poucas coisas que justifiquem a sessão.

Há algo que mina o potencial estupendo desta cena para o público brasileiro: ouve-se, se não pela primeira vez (dado o lançamento dos DVDs com som original), a voz original de Vivar - cujo tom mais agudo chega a ser inesperado - mas ainda por cima, ouve-se Vivar com sotaque espanhol. Poderíamos até supor que o ator tenha sido ironicamente dublado para não destoar sonicamente do resto do elenco.

Acho que meu take em cima de "O Orfanato" já está bem estabelecido: o filme me entediou ao nirvana. Mas eu tenho que sugerir algo: se houver uma sessão de "O Orfanato" dublado com a voz do Sr. Barriga como a conhecemos, há alguma chance do filme subir no seu conceito?

Sim.

Por isso, caso seja do seu interesse, eu teria que recomendar a sessão dublada, caso houvesse alguma. Somente a mera idéia de se ouvir a voz do Sr. Barriga (dublada pelo falecido Mauro Villela), associada ao ator do Sr. Barriga, não mais exigindo o aluguel, mas dando uma palestra sobre Jung (!) me atrairia o bastante para tentar retornar ao cinema. Convenhamos: não encontrei muito o que salvar do filme de J. A. Bayona (que, repito, tem estilo de sobra, mas é infectado por uma série de derivações e banalidades sem inspiração, provavelmente impostas pelos grandes nomes por trás da produção) , mas esse possível momento de nostalgia burra automática conseguiria se sobrepôr às deficiências múltiplas das quais sofre o filme. Trata-se de momento de fetiche que faz sentido apenas para quem associa "Chaves" à própria infância (portanto, não dando um aval automático ao filme em base de fixações pessoais, como muitos textos certamente farão) e, por bem ou por mal, é o meu caso de assombração pessoal que acaba se transferindo para o filme, mas não como signo de medo.

Pode parecer saudosismo intransigente, mas esse afeto é fruto nada mais do que da própria natureza do cinema, dessa estranha associação entre imagem e som independentes, desconexos, tornados inseparáveis, indistinguíveis. Ainda prefiro assoistir a todos os filmes que assisti na minha infância dublados. Eu não faço a menor idéia do que seja o Indiana Jones de "Os Caçadores da Arca Perdida" e do "Templo da Perdição" com a voz original de Harrison Ford (assisti "A Última Cruzada" no cinema - e no Metro Boavista, ainda por cima). Stallone? "Você é um imaturo, você é um cocô" forever. E assim vai para Schwarzenegger, Goonies, Gatinhas e Gatões, etc. Ter que assistir hoje a esses filmes na versão original não me parece uma experiência natural, me incomoda horrores, como se uma trilha nova, diferente e dissonante tivesse sido obrigatoriamente imposta sobre os longas. O som "original" (termo que precisa ser colocado em algum cheque, dada a natureza do som no cinema), para quem cresceu com outro som, um som secundário à época da primeira revelação, não poderia ser mais artificial. A natureza do filme é muda e o som uma fundação pós-moldada prevendo dar fluidez aos cortes, profundidade aos planos, credibilidade à ilusão cinematográfica, mas ele não pertence à película naturalmente, originalmente. A película é muda, o som sempre a dubla. Poderíamos portanto dizer que o som original é somente aquele que foi escutado pelo espectador ao assistir a um filme pela primeira vez. Que o espectador tenha sempre a sorte de descobri-los com o melhor som possível.
  Bernardo Krivochein    sexta-feira, março 07, 2008    15 comentários
 
 
Um dilema para o fim de semana

Paulo Vilhena em uma cena de "O Magnata"

Então... "O Magnata" enfim saiu em DVD após sua meteórica passagem pelos cinemas brasileiros, dando assim mais uma oportunidade aos espectadores para ignorá-lo, em outro formato.

Confesso que pelo trash da coisa, eu quero assistir ao "filme do Chorão". Digressão: o crédito "um filme de" - pelo menos em Hollywood - só é permitido aos filmes nos quais o mesmo artista assine simultaneamente o roteiro e a direção. No resto do mundo, o crédito é conferido com menos rigor aos diretores, mas deve ser a primeira vez no mundo que atribui-se a autoria ao roteirista/produtor ao invés da direção. Cinema brasileiro, cinema pioneiro. Palmas ao diretor Johnny Araújo pelo desapego - ou indiferença - a obra ao ponto de renegar-lhe a autoria/responsabilidade. Ele deve saber o que faz.

Sessões de filmes podreira sempre foram uma tradição bastante prezada entre todos os círculos de amigos que freqüentei, seja a inesquecível sessão dupla de "Cinderela Bahiana" (quarta reprise) com "Marcela: a Fantasminha Tarada" (um pornô válido apenas pela paudurescente incompetência técnica), "Xuxa e os Duendes" ("batam palmas se vocês acreditam em duendes!" - rapaz, e como aplaudimos...), ou mesmo a sessão de "Xuxa Requebra" em pleno Rock in Rio 3 ("aê...quem é esperto, não usa drogas!"), ou ainda "Dom" de Moacyr Góes. E eu juro que a nacionalidade em comum dos filmes é puramente acidental. A verdade é que eu morro de vergonha de ser visto alugando este filme.

Isto vindo de quem já alugou O Intrometedor Anal 6 em pleno meio-dia, na frente de alunas de colégio católico (E aê? Belê?...).

Parece que uma lápide social intransponível será colocada sobre meu cadastro na locadora caso eu alugue este filme. Os balconistas parecem até bastante acostumados com o meu histórico, que acumula o marco das únicas locações já feitas para "Crocodilo", "DinoCroc", "Octopus" ou "Boa vs. Python" (fã da Nu Image bem aqui), mas algo me diz que o aluguel de "O Magnata" será minha letra escarlate. Eu poderia baixá-lo, mas o arquivo pode atrasar todos os meus outros downloads e eu tenho que privilegiar minha querida zoofilia amazonense. Eu poderia comprar o pirata, mas o custo superior a de uma locação e o inconveniente de manter o disco para possíveis futuras zoações de terceiros me desmotivam. E, afinal de contas, não é nenhum "Tropa de Elite" que mereça realmente ser comprado pirata. Chegou um momento em que se comprava DVD pirata do "Tropa de Elite" mesmo quando já se possuía outras cópias, só pelo costume. Chego perto do filme na prateleira, respiro fundo, mas não consigo pegá-lo nem para ler a sinopse no verso, com medo de pegar alguma ziquezira de pele. E ei, por que esse olhar repreendedor, sua velha escrota? A pessoa não tem mais o direito de atirar um DVD no chão e se tremer de nojo?

Só me resta imaginar a elaboração Diablo Codyana emprestada aos diálogos híper-elaborados, o emocionante pathos de arrependimento do personagem de Paulo (inho?) Vilhena Piovani, a estética MTV tão vanguardista no cinema... dos anos 90, o skate na veia (na véia?), o surfe na veia, os esporrrte radical tudo na veia, mano, os puta prédio, as puta mina lôca, os puta carro, as puta puta e, como esquecer?, a trilha sonora de Nino Rota. Uma pena, pois eu queria realmente decifrar essa obsessão que Chorão nutre pelos magnatas - que remete aos marajás do Collor: tinha aquele clipe do "Rubão, Rubão, deu um tiro na fuça do ladrão desiludido da vida" que ensaiava uma espécie de desprezo ao gênero ricaço-acha-que-pode-tudo e aqui temos um longa dedicado a estudar esse personagem, provavelmente fazendo-o ter uma epifania sobre o vazio de sua vida, mas ainda perdoando-o de certa forma. Eu, hein. Mas Deus sabe o que faz. Provavelmente será o único longa-metragem a passar em alta rotação na MTV. Infelizmente, é o único filme realmente merecedor de uma dublagem humorística do Hermes & Renato que não terá essse direito.

NOTA: já ouvi falar os montes de "10.000 A.C.", inclusive um boato de que Jesus ainda não existia nessa época. Talvez seja o preço a pagar pelo paganismo: me xingaram o novo filme de Emmerich dos pés a cabeça, chamando-o da pior coisa de que um filme desse tipo pode ser chamado: de "chato". Sem "O Magnata" então, sexta-feira, sessão da meia-noite, me aguarde.
  Bernardo Krivochein    sexta-feira, março 07, 2008    1 comentários
 
 
Compartilhe: Sebastien Tellier - "Sexuality"


"Eu gostaria que minhas músicas fossem utilizadas em filmes pornô." - Sebastien Tellier

Qualquer pornô gostaria de ter a sorte de poder contar com uma faixa - qualquer uma - de "Sexuality", o novo álbum do francês Sebastien Tellier, em sua trilha. A Dança do Créu em francês é definitivamente mais gostosa: enquanto os ritmos americanos atuais apelam para uma sexualidade escancarada que torna sua óbvia indecência um tanto enfadonha, há algo de elaboradamente risqué no álbum de Tellier - ou seja, ainda se enquadrando dentro do aceitável, mas por muito pouco. Isto é "música de motel" sem a menor sombra de dúvida, como muitos artistas de adult contemporary music o são, mas ao contrário deles (Sade, Bryan Ferry, etc.), que tem sua arte associada a saliências de terceiros à sua revelia, Tellier faz uma música assumidamente tarada, feita exatamente com os devidos fins.

Qualquer um que trepar ao som de Tellier neste fim de semana (e se você baixar o álbum, saberá que te resta pouca escolha), vai trepar melhor, ou pelo menos com mais bom gosto. Após seu belíssimo "Politcs" (um álbum quase conceitual pelo tema único que o amarra, puxado pelo sucesso do hit "La Ritournelle"), em seu segundo álbum Tellier, praticamente no sentido inverso de seus eventuais parceiros de cama, consegue transcender as paredes de motéis com um trabalho de um pop irresistível e rebuscado, repleto de faixas paradoxalmente (ou nem tanto, se considerarmos o teor sexual da maioria dos sucessos atuais) radiofônicas ao seu conteúdo "proibido para menores", prontas para grudar nos ouvidos. A produção a cargo de Guy Manuel de Homem-Christo, metade do duo Daft Punk, se faz notar especialmente se compararmos as semelhanças entre o som de Tellier e aquele do Le Knight Club (também produzido por Homem-Christo): "Sexuality" é impregnado pelo synth pop vintage e pela atmosfera erótica-robótica característica de seus trabalhos.

Trata-se de um álbum que muitos poderão acusar de enfadonho e previsível após certo tempo - afinal, todas suas faixas são estritamente sobre a mesma coisa: "aquilo" (e você não precisa falar uma palavra sequer de francês para entender o conteúdo das músicas: as batidas sedutoras e os gemidos femininos e masculinos deixam bastante claro o que é que os personagens das canções estão fazendo) - mas há algo de extremamente admirável na obstinação com que Tellier se debruça em cima do tema da sexualidade: o mesmo engajamento emprestado aos temas políticos em seu primeiro álbum é utilizado a favor do erótico, do sensual, em "Sexuality". Engajamento tesudo. Por que o sexual não é enxergado como material de defesas tão apaixonadas quanto o esporte, a política, o social? E não digo a questão das "escolhas" sexuais - porque ninguém ao nascer assinalou opções de foda à la carte - mas do envolvimento físico e emocional com terceiros, que trata-se aliás do maior dos engajamentos que alguém terá em vida. Engajamento tornou-se um sinônimo contemporâneo de verborragia, tendo o carnal completamente alienado de seu significado por um bando de intelectuais frustrados. Tellier nos mostra como recuperá-lo. A capa - que já bastaria para eleger "Sexuality"como o álbum do ano - encapsula bastante da idéia de Tellier: corpos como territórios inóspitos, bucólicos até, amplos e dignos de desbravamento. Antes que possam acusá-lo de chauvinista desapegado apenas interessado em sexo, Tellier já deixa bem claro na primeira faixa do álbum, a excepcional "Roche", que ele faz questão que a mulher esteja "amoureuse de Sebastien". E se a perfuração por poços de petróleo nas coxas das mulheres é a expressão sexual a rigeur do funk e do hip-hop de maior sucesso atualmente, sexo apaixonado e intenso, nas próprias palavras de Tellier, "c'est ah! C'est ah!"

Escute a faixa "Roche" de Sebastien Tellier. Música do ano?



Veja o belo vídeo Jean-Michel Jarresco de "Sexual Sportswear" (dirigido por Manu & Fleur)

  Bernardo Krivochein    quinta-feira, março 06, 2008    1 comentários
 
 


Compartilhe: Into The Wild



O ator Sean Penn não está estreando como diretor em "Na Natureza Selvagem" (é seu quarto longa de ficção) mas há alguma coisa muito atraente e jovem que o faz parecer um filme de estreante, no bom sentido do termo. Uma jovialidade quase inocente ou uma permissividade ingênua que em pensamentos seria... "eu posso me mostrar com aquilo que gostaria de ser lembrado" ou, ainda, "eu posso me esbaldar naquilo que minha cultura pode espelhar de mais sensível, sentimental e verdadeiro". "Into the Wild" evoca o tempo todo, em seus longos 148 minutos de duração, os tópicos: liberdade, sociedade, natureza, verdade, sentimento, moral, solidão, e este mix de tudo é um mergulho numa utopia pós-hippie, que nem seus tios mais velhos acreditariam mais.

Falando assim parece que o filme é superficial, mas aí é que está. É esta força pós-utópica de Christopher McCandless (personagem real que o escritor e alpinista Jon Krakauer se baseou para escrever o livro, um best-seller no Estados Unidos, de mesmo nome roteirizado por Sean Penn) que faz com que o filme tenha uma empatia insuportavelmente compartilhada por todos - quem nunca pensou em abandonar tudo e partir em busca de uma liberdade grau zero?

A história, que se passa entre o final da década de 80 e início dos anos 90, é real: depois de sua formatura aos 22 anos, Chris (Emile Hirsch) doa sua poupança, abandona sua família, seu carro, destrói sua identidade, seus cartões de crédito e seguridade, queima o que lhe sobra de dinheiro e parte em busca daquilo que considera sua liberdade. Sem dinheiro, viaja por dois anos pelos lugares mais belos e inóspitos, trabalha daqui e dali, conhece pessoas que se afeiçoam a ele, e parte para um plano audacioso: ir para o Alaska onde pretende viver em meio a natureza por sua conta e risco.

O que impressiona em Chris é sua determinação, força física e disposição para estar sozinho, sem vínculos, sem cronogramas. Sua rebeldia não está apenas na vontade de trilhar um caminho menos convencional ou em se negar a obedecer os parâmetros da tal "american society" mas numa entrega ao acaso, numa total falta de estrutura para viver a aventura de sua vida. Ao se negar a planejar seu caminho, ele deixa de ser um aventureiro do tipo esportista e atlético e bem programado dos dias de hoje, que corre maratona cercado de água e gatorade ou que escala montanhas guiados por GPS. Chris não tem gadgets, nem mapas, se cerca de livros (literatura e filosofia, alguma coisa sobre plantas), conselhos sobre caça, não tem rádio, nem como se comunicar, é um simples andarilho num corpo bom fisicamente. E com este espírito aventureiro ( um termo tão anos 70) que ele parte para o Alaska.

É fácil ver como Sean Penn se encantou com a história de Krakauer & Chris, ele mesmo um ator "quase" outsider/rebelde, que sempre demonstrou ares de insatisfação com o star system. Este filme é sem dúvida seu alter-ego. O roteiro, os letterings, a fotografia, a música, a narração em off da irmã de Chris (uma voz doce e sentimental que conta a história)- o filme se faz tão genuinamente americano! A escolha de Eddie Vedder (Pearl Jam) para a trilha é perfeita, porque em certos momentos é isto: música e imagens, belas imagens, uma câmera nada modesta que explora todas as possibilidades visuais deste belo país. Acompanha Chris, seus gestos, seu olhar, seu cabelo, sua alegria, tão de perto, num tom às vezes quase documental, o que torna em certo momento, o seu olhar, e piscadela para câmera, um gesto praticamente natural. Ok, sabemos que é um filme de ficção. Chore, sem culpa, não há como escapar deste sentimentalismo!

A América já sonhou com um mundo assim no qual o dinheiro não seria o centro da vida, um país idílico, numa fantasia idem. Onde os pais seriam os representantes de um mundo velho, arraigado ao poder e a mentira vã do dinheiro; e os filhos seriam este futuro da potência sentimental, do encontro do homem com seu verdadeiro estado natural, andante, sem vínculos, ludens. Mas sabemos que a divisão que se faz hoje em dia não é tão romântica e que esta mesma sociedade chama a tudo que não acolhe de freak! Christopher McCandless não é um freak porque sabe que sua experiência será compartilhada, ao escrever sobre ela e dizer: "sou um viajante estético cuja casa é a estrada." Quando enfim conclui que o melhor da liberdade é que ela seja compartilhada... assim como as escolhas estéticas de Sean.
  Francesca Azzi    segunda-feira, março 03, 2008    2 comentários
 
 
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